A Ameaça de ISS na exportação de serviços

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Discussão sobre a obrigação de empresa brasileira recolher o Imposto sobre Serviços (“ISS”) sobre a receita auferida na gestão de fundo de investimentos domiciliado no exterior.

No início do mês de maio deste ano, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) julgou o ARESP 1.150.353/SP, que envolve discussão sobre a obrigação de empresa brasileira recolher o Imposto sobre Serviços (“ISS”) sobre a receita auferida na gestão de fundo de investimentos domiciliado no exterior.

Não é a primeira vez que os ministros do STJ analisam os limites da não incidência do ISS na exportação de serviço prestado por empresa brasileira, bem como o conceito de “resultado” do serviço previsto no parágrafo único do artigo 2º, I, da Lei Complementar 116/03.

Antes de adentrar na controvérsia existente sobre o tema, vale lembrar que, segundo dados oficiais, o setor de prestação de serviços é o que mais emprega no Brasil[1] e o que mais abriu postos de trabalho em 2021[2]. Este protagonismo do setor não é uma característica nacional, mas sim uma tendência global.

Aliás, vale destacar que o setor de prestação de serviços recebeu uma nova significação a partir do desenvolvimento da economia digital e de sua alavancagem gerada pela pandemia.

Nesse contexto, além de exportador de commodities, o país tem condições e deve se destacar como exportador de serviços. Mas, para tanto, é indispensável eliminar certas barreiras jurídicas e econômicas que resultam na perda de competitividade da empresa brasileira quando comparada com outros players internacionais.

Sensível a essa necessidade, a Constituição Federal do Brasil, incorporando o princípio da não exportação de tributos, determinou em seu artigo 156 que a lei infraconstitucional deveria excluir da incidência do ISS as exportações de serviços para o exterior. Sem qualquer limitação ou condição.

No entanto, a Lei Complementar nº 116/2003, ao regulamentar a não incidência, trouxe hipótese de exceção subjetiva ao determinar a tributação pelo ISS dos “serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior”. A partir da edição da lei, inúmeros são os debates doutrinários e jurisprudenciais sobre o conceito de “resultado” previsto na norma infraconstitucional.

O problema é que se o contribuinte depender da interpretação adotada pelos mais de 5.000 municípios e milhares de magistrados deste país, a não incidência constitucional simplesmente desaparece.

Infelizmente, a interpretação do STJ ao tratar da questão não é coesa. Existem precedentes em que se entendeu como ocorrido o “resultado” no local onde se finaliza o serviço contratado. O objeto de um dos julgados em que se aplicou tal entendimento era o de empresa brasileira que realizava conserto de turbinas de avião no território brasileiro para cliente residente no exterior. No caso, os ministros concluíram que o resultado do serviço ocorreu no Brasil.

Já em outro processo em que se discutiu a não incidência do ISS na exportação de serviços, o STJ considerou como ocorrido o “resultado” no local onde o serviço seria utilizado.  Tratava-se serviço de elaboração de projeto de engenharia realizado por pessoa jurídica residente no Brasil para ser executado na França. Naquela oportunidade, foi considerado que o resultado do serviço ocorreu na França e, por tal razão, não haveria incidência do ISS.

Pois bem, voltando ao recente julgamento do ARESP 1.150.353/SP, como visto, envolvia serviço de gestão de fundo prestado por empresa brasileira, em favor de entidade não residente (o fundo ou seu administrador).

O Ministro relator Gurgel Faria entendeu que “o resultado do serviço prestado por empresa sediada no Brasil de gestão de carteira de fundo de investimento, ainda que constituído no exterior, realiza-se no lugar onde está situado seu estabelecimento prestador, pois é nesse lugar que são apurados os rendimentos (ou prejuízos) decorrentes das ordens de compra e venda de ativos tomadas pelo gestor e que, desde logo, refletem materialmente na variação patrimonial do fundo.”.

Na visão do ilustre Ministro relator, seguido pela maioria dos demais Ministros do STJ presentes no julgamento, o “resultado” do serviço seria as ordens de compras e vendas de ativos realizadas pelo gestor no Brasil, e não o aumento ou diminuição do patrimônio do fundo residente no exterior. Esta linha de raciocínio acaba por gerar uma conclusão simples: não é aplicável a não incidência de ISS na gestão de fundos realizados em favor de não residentes.

Ou melhor, se o gestor do fundo viajar e realizar as ordens de compra e venda do exterior talvez seja possível pleitear a não incidência do ISS. Não me parece ter sido esse o intuito do constituinte originário nem tampouco do legislador complementar.

Em tempos pandêmicos, em que o trabalho remoto ampliou o seu horizonte e a competitividade entre as empresas, a aplicação deste entendimento por certo afetará o desempenho da empresa brasileira no cenário internacional.

Sem dúvida, esta incerteza poderia ter sido evitada pela edição de normas com contornos mais claros e objetivos. No entanto, o problema existe e persistirá enquanto o judiciário não trouxer a tão esperada elucidação e definição para o tema.

A incerteza que paira sobre o assunto fica evidente pelos votos dos Ministros do STJ no caso relatado quando esclareceram que o resultado do julgamento não pode ser considerado como antecipação sobre novos casos que cheguem ao judiciário, inclusive em relação à área do mercado de capitais.

Os efeitos deletérios da insegurança jurídica que permeia as questões tributárias são bem conhecidos dos brasileiros, escassez de investimentos, dificuldades no planejamento de contas, contencioso com ônus excessivo para contribuintes, fazenda pública e tribunais. E por aí vai.

Infelizmente, a verificação desse tipo de problema em um momento de crise econômica no setor de serviços, tão importante para o Brasil, parece anacrônico e contraproducente.

Por ora, esperemos que os nossos competentes tribunais resolvam o tema de forma definitiva e em linha com os princípios constitucionais de não exportação de tributos e em prol da competitividade do empresariado brasileiro.

Fonte: jornaljurid.com.br

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