Os pequenos negócios, que levam a merecida fama de serem os maiores geradores de emprego formal no país, criaram 71,8%, ou 2.094.812 das vagas com carteira assinada entre julho de 2020 e julho de 2021.
Estes dados, compilados pelo Sebrae Nacional com base nos números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, mostram que micro e pequenas empresas, e até MEIs, têm dado fôlego extra à retomada lenta e gradual da economia à medida que a vacinação avança.
Mas, para essa retomada ser sustentável e sem sustos, a advogada Sandra Regina Bruno Fiorentini, consultora do Sebrae-SP, aponta questões importantes para quem precisar contratar, como realizar um processo de recrutamento e seleção que melhore a qualidade da equipe, e também diminua a rotatividade.
E ainda, a importância de fazer um planejamento trabalhista que reduza custos dentro da lei, evitando a judicialização. “O maior patrimônio de uma empresa são as pessoas. Ou então, ela não é nada”, afirma.
Confira a seguir algumas dicas sobre como estruturar uma boa equipe, de acordo com a legislação, apresentadas por Sandra no evento virtual ‘Surpreenda Varejo’, realizado na última semana de agosto pelo Sebrae-SP em parceria com a Associação Comercial de São Paulo (ACSP):
GESTÃO DE PESSOAS
1 – RECRUTAMENTO
Para recrutar colaboradores, é preciso seguir três passos importantes para o processo deslanchar: verificar qual a necessidade de mão de obra, definir as fontes de recrutamento e o modo de divulgação da vaga.
Após determinar qual a pessoa ou quantas pessoas que vão suprir essa necessidade, vale recorrer a expedientes como bancos de currículo on-line, indicação de conhecidos e até placas na fachada da empresa.
Só não vale contratar sem muito critério ou dar chance a parentes para facilitar o processo e ganhar tempo. “O empregado entra sem integração, tem pouco aproveitamento e acaba sendo demitido”, diz Sandra.
Por isso, o recrutamento deve ser criterioso. “Mandamos embora logo por considerá-los ‘fraquinhos’, mas o erro é nosso”, afirma. “Já o parente pode pedir a conta de repente, e você fica na mão cheio de serviço.”
2 – DESENHO DE CARGOS
Esse modelo de formulário, que pode ser encontrado on-line, é uma ferramenta de gestão de pessoas muito simples, mas que serve para retratar a maneira como o cargo é estruturado, considerando suas tarefas, competências, deveres e requisitos, sempre visando alcançar os objetivos da organização.
Com ele, segundo Sandra, é possível alimentar desde perfil e qualificação desejados, definir a quem o empregado será subordinado, suas atividades, remuneração e até possibilidades de crescimento, explica.
3 – CARGO x FUNÇÃO
Outro passo importante no processo de gestão de pessoas que precisa ser bem definido: cargo é o nome atribuído à posição que a pessoa ocupa na empresa, e função é o conjunto de tarefas atribuídas a esse cargo.
O Cadastro Brasileiro de Ocupações (CBO) do Ministério do Trabalho e Emprego, que pode ser consultado aqui, é uma ferramenta essencial que descreve o conjunto de tarefas, métodos e processos de um cargo específico, além de nortear as atividades de cada função, a quem se reporta ou quem supervisionará.
Sandra Fiorentini lembra outro conceito de gestão, o CHA (Competência+Habilidade+Atitude), que serve para definir de forma concreta os skills desse colaborador. “Afinal, funcionário não é faz-tudo”, destaca.
4 – SELEÇÃO
O conjunto de procedimentos e técnicas aplicadas aos candidatos para escolher os mais adequados ao perfil da vaga se baseia em duas variáveis: necessidade da empresa e necessidade do candidato.
As etapas do processo incluem análise de currículo ou fichas de solicitação de emprego, entrevista de triagem, avaliações e testes, escolha dos finalistas e entrevista técnica.
Mas, como os donos de MPEs geralmente dedicam a maior parte do tempo para manter o negócio andando, muitas vezes não têm tempo e precisam resolver a questão a toque de caixa, diz a consultora do Sebrae-SP.
Só não adianta se precipitar: se o candidato não tem perfil, melhor descartá-lo, alerta. E se possui mais qualificações do que a empresa necessita, será inadequado para a vaga.
“Antes de procurar fora, avalie se há alguém na empresa apto a assumir a função. Vale fazer testes de perfil pela internet, ou até procurar investir em uma empresa de recrutamento e seleção para otimizar o processo.”
5 – TÉCNICAS DE ENTREVISTA
Para que a entrevista com o novo candidato renda, é importante ficar atento a pontos como criar um roteiro de perguntas, determinar o local e horário da entrevista e receber o candidato com o currículo já analisado.
Frente a frente, aja com respeito, atenção e cordialidade, tome cuidado com a linguagem e ouça mais do que fale, orienta a advogada. Definida a aprovação, tome nota, para si mesmo, dos pontos fortes, daqueles a desenvolver, resultados dos testes e comentários adicionais para nortear o relacionamento.
“Contratar é buscar as melhores pessoas, para fazer delas os melhores profissionais”, afirma.
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA
6 – PLANEJAMENTO TRABALHISTA
Em 2017, a Lei 13.467, da Reforma Trabalhista, fez várias alterações e atualizações na CLT que determinam a contratação de empregados e terceiros de acordo com as novas necessidades das empresas.
Por isso, segundo Sandra, fazer um planejamento trabalhista possibilita a correta análise e adequação da legislação, com objetivo de reduzir custos com empregados dentro dos limites mínimos permitidos por lei
Dessa forma, o empresário poderá detectar as vantagens e desvantagens de contratar empregados ou terceiros nos mais diversos tipos de trabalho, mas sempre considerando a sazonalidade ao longo do ano.
Ou seja, os períodos em que o negócio vende ou produz mais, ou menos. “Planeje o que não pode e o que pode ser negociado entre as partes, e reflita sobre seus impactos nas relações trabalhistas”, orienta.
7 – VÍNCULO EMPREGATÍCIO
O conceito de vínculo empregatício se baseia nos princípios de pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação. Portanto, é preciso ficar atento a particularidades na contratação fora da CLT que, em vez de cortar custos, só irão onerar mais o empregador, gerando multas, autuações e até ações trabalhistas.
“Quem é PJ não pode colocar uma faxineira como diarista: se for para trabalhar todos os dias, tem que contratar pela CLT”, avisa a consultora do Sebrae-SP.
8 – BANCO DE HORAS, FÉRIAS E BENEFÍCIOS
Quando o pequeno negócio contratar um funcionário, não pode esquecer de detalhes como Banco de Horas, regido pelo art.59, § 2° da CLT. Horas extras habituais não descaracterizam o banco, mas esse banco, que tem prazo de até seis meses, deve ser negociado por acordo individual entre as partes ou negociação coletiva.
Já as férias de 30 dias mais o abono pecuniário (um terço) também são determinadas pelos artigos 134, 135 e 136 da CLT, destaca Sandra, e se o empregado concordar, podem ser usufruídas em até três períodos por ano.
Para quem conceder benefícios, vale lembrar que alguns não integram a remuneração para fins de cálculo de encargos trabalhistas e previdenciários, como auxílio-alimentação, diárias para viagem, prêmios e abonos.
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9 – NOVOS TIPOS DE CONTRATO
A nova legislação prevê diferentes maneiras de contratação de empregados ou terceiros, mais flexíveis e adaptadas à realidade atual e à sazonalidade de cada negócio. A advogada mostra os principais tipos:
Em tempo parcial – quando a empresa necessita do empregado por até 30 horas semanais. Pode ser de 30 horas, mas sem horas extras, ou de 26 com até seis horas extras semanais. Aqui, o salário é proporcional à jornada em relação aos funcionários do mesmo cargo que cumprem a jornada integral. (Art.58 – CLT)
Intermitente – quando a prestação de serviços com subordinação não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade determinados em horas, dias ou meses.
Aqui, o empregado não tem jornada e horários pré-estabelecidos: o empregador deve convocá-lo para o serviço com três dias corridos de antecedência, e o empregado terá um dia corrido para aceitar ou não.
10 – CONTRATAÇÕES POR MEIs
O MEI pode contratar, mas o limite é uma pessoa (funcionário, estagiário ou aprendiz) por CNPJ. E como seu faturamento é limitado (R$ 81 mil ao ano, com média de R$ 6.750 mensais), o salário do empregado também tem um teto: salário mínimo vigente, piso da categoria ou bolsa-auxílio.
“Não é o microempreendedor que define o salário do colaborador, e sim a legislação”, diz Sandra.
O custo de contratação para o MEI é de 11% sobre o salário pago, sendo 3% INSS e 8% de FGTS. O funcionário também terá direito a férias e 13° salário. “Por outro lado, é vedada a contratação de um MEI para atividade contínua do contratante – como um salão de beleza, por exemplo”, explica a advogada.
11 – ESTAGIÁRIOS E APRENDIZES
Pequenos negócios e MEIs podem contratar estagiários (Lei 11.788/08) e aprendizes (Lei 10.097/2000), desde que sigam algumas regras. Uma delas é que estejam cursando ensino fundamental II, médio ou superior.
No caso das MPEs, a contratação deve ser de acordo com o número de funcionários, conforme determinam as leis de estágio e aprendizado. Já os MEIs que pretendem fazer essa contratação precisam ter ensino superior.
Também é preciso ficar atento à carga horária, e formalizar um contrato com os deveres e direitos de ambos, segundo a consultora do Sebrae-SP. “Mas como gestor, analise a capacidade financeira da sua empresa para avaliar se é possível pagar a nova contratação antes de formalizar o contrato com esses jovens.”
12 – TERCEIRIZAÇÃO
O art 4° da Lei 6019/74 determina a prestação de serviços de terceirização, que nada mais é que a transferência feita pela contratante, da execução de quaisquer atividades – inclusive a principal -, à pessoa jurídica de direito privado que possua capacidade econômica compatível com sua execução.
Entre elas, empresas de prestação de serviços a terceiros, pessoas jurídicas de direito privado, com capital social x n° empregados e as que contratam, remuneram e dirigem o trabalho realizado pela equipe.
Mas, enquanto os pequenos negócios podem se encaixar nessa atividade, para os MEIs a história é outra, destaca Sandra. “Se o MEI contratado para prestar um serviço passa a realizar atividade habitual e contínua, configura vínculo de emprego, e em consequência, pode gerar uma ação trabalhista”, alerta.
Fonte: Dcomerio Por Karina Lignelli