Jota Contábil

‘Nada vem de graça, você tem de se dedicar, transpirar’

Gerente geral para a América Latina da produtora de software de governança Axway, Marcelo Ramos ressalta a importância do esforço para o crescimento profissional

FOTO: HÉLVIO ROMERO / ESTADÃO
FOTO: HÉLVIO ROMERO / ESTADÃO

Cláudio Marques

Principal executivo da Axway na América Latina, Marcelo Ramos, de 50 anos, costuma dizer que a empresa é uma combinação de todas as outras pelas quais passou, aí incluídas a Prológica, da época da reserva de mercado na informática, IBM, Sterling Commerce/AT&T, GXS e Digilab. “Parece que a empresa estava esperando eu estar pronto para presidi-la, porque ela tem um pouco de cada uma das empresas pelas quais eu tive a oportunidade de passar. Para mim tem sido um desafio sensacional. Sou apaixonado pelo que estou fazendo, que é expandir a empresa, vê-la crescer não só no Brasil, mas no mercado latino-americano”, afirma. De origem francesa com sede nos Estados Unidos, a Axway produz software para governança de dados e tem um faturamento global de US$ 347,1 milhões. De origem humilde, vendia pipas para conseguir dinheiro para suas “regalias”, Marcelo Ramos viu no ensino médio técnico uma maneira de ter independência financeira e construir uma carreira sólida. Deu certo. A seguir, trechos da conversa.

Área técnica
Minha carreira foi toda desenvolvida na área técnica. Talvez desde a infância, com aquele desejo de mexer nas coisas, devia ser essa aptidão para exatas se manifestando em brincadeiras como desmontar relógios e aparelhos. Minha formação é toda técnica, fiz colegial técnico, na Escola Técnica Federal de São Paulo. Digo isso com muito orgulho, porque era uma das melhores escolas técnicas naquela época, década 1980. Depois eu fiz especialização em ciências da computação e só há cerca de dez anos que eu enveredei por outra área, de gestão de pessoas. Meu MBA é em liderança e gestão de pessoas, que eu me apaixonei também.

Família humilde
Eu comecei a trabalhar muito cedo. Sou de uma família muito humilde. Meu pai nos dava o conforto necessário para que estivéssemos sempre colocando como prioridade o estudo. Mas também tinha desejos, extravagâncias de criança, de querer um brinquedo, mas a família não tinha condições de comprar. Então, eu comecei a fazer pequenos trabalhos, como empacotador em lojas de departamentos na época das férias, e ganhava um dinheirinho. Comprava vareta, papel de seda e fazia pipas para vender e ter dinheiro para as minhas regalias.

Ensino técnico
Quando eu acabei o ensino fundamental, eu me perguntava como iria conseguir alguma independência. E foi aí que optei pelo colegial técnico. Essa foi a primeira decisão na carreira, enveredar por um colegial técnico, no qual o quarto ano é um estágio no ambiente corporativo. Eu tinha 17 anos de idade e o estágio era como técnico em eletrônica. Quando eu tirei o diploma recebi o convite para ser efetivado como funcionário. Eu já tinha carteira assinada antes de entrar na faculdade. Queria fazer faculdade para turbinar a carreira, para começar a galgar postos mais importantes, mais avançados, mais complexos, mais desafiadores na empresa em que eu trabalhava, que era a Prológica. Eu me formei em bacharel em matemática e em ciências da computação, e com isso eu ganhei uma promoção.

Gerenciar e liderar
Uma confusão que comumente as empresas fazem é que ser um bom técnico não significa ser um bom gerente e ser gerente não tem nada a ver com liderar. Isso se aprende com o tempo e eu fui buscando me aprimorar em liderança. Depois, com o diploma superior e com a quebra da reserva de mercado (na área de informática), eu continuei buscando meu sonho de crescer na carreira e acabei ingressando na IBM. A empresa deu outro impulso a minha vida profissional, continuei os estudos.

Começo do zero
Recebi um convite para sair da IBM e entrei na Sterling como quarto funcionário. Foi uma coisa inusitada sair de uma gigante como a IBM, uma grande escola, uma empresa que respeito muito, para me juntar a uma empresa que estava chegando ao Brasil, naquela época em que as importações foram liberadas. O mercado estava mudando muito, estavam aportando no Brasil muitas empresas multinacionais de tamanho mediano, e eu resolvi arriscar. Eu tinha um conjunto de competências, e me especializei na área “como os computadores conversam entre si”. Ou seja, a área de integração, como fazer empresas trocarem informações com outras empresas, que é o que eu tenho trabalhado nos últimos anos. Isso chamou a atenção dessa empresa, Sterling, que me convidou e eu, de quarto funcionário, acabei presidindo a companhia. Foi minha primeira experiência como presidente. Tinha 38 anos.

A volta
Fiz uma carreira de 16 anos na empresa até ela, a Sterling, ser comprada pela própria IBM. E eu voltei à empresa novamente. Voltei para IBM e fui muito bem recebido, já num momento diferente da minha carreira, mais experiente, com mais quilometragem de vida profissional. E acabei liderando uma divisão muito importante, que persiste até hoje, que era a divisão de smarter commerce, onde são necessárias soluções de integração. Minha carreira toda foi nessa área de como você integra diversos produtos de diversos temas de diversas empresas. Mas fui convidado novamente para presidir uma outra empresa, a GXS, que também tem uma reputação incrível no mercado, principalmente no financeiro, ela foi criada por três bancos, Citibank, Itaú e Santander. Ela fazia serviços de integração, principalmente no mercado financeiro, e eu presidi a empresa. Ela era uma empresa de serviços.

Mudanças e credibilidade
Essas mudanças profissionais que eu tive oportunidade fazer, por acaso todas elas deram certo. Eu avaliava, pensava, tomava decisão e fazia acontecer. Mas também acho que é um pouco da credibilidade, da confiança que você constrói (ser chamado para novos desafios). Então, acho que isso ajudou bastante, os headhunters conhecem o trabalho que fiz em outras empresas, sabem usar a ferramenta certa para pôr o parafuso correto. Então, o Marcelo, além da paixão, tem um conjunto de competências para pegá-lo para uma operação de pequeno e médio porte e turbiná-la. E, é verdade, é o que eu mais gosto de fazer, essa coisa de desafio. É aquela máxima de que se não se podemos ser o maior, temos de ser o melhor em nosso segmento. Isso me atrai muito. Dessa forma se conquista um cliente.

Pessoas
Liderar pessoas é meio solitário. Mas eu descobri um lado fascinante que é investir em conhecer as pessoas, ter interesse por elas, não só você pode ajudá-las, mas também saber como elas vão poder ajudá-lo. É pensar como equipe. Gerenciar não é só analisar planilha, não é só montar orçamento, dar orientações, é muito mais do que isso. Tem de entender que cada pessoa tem um perfil diferente, cada ser humano é único, tem aspirações, tem desejos, ambições, sonhos. Eu acho que o papel de um bom líder é unir esses fatores que todo ser humano tem com o que a empresa pode proporcionar para alavancar isso para ele. Assim, o ambiente de trabalho fica harmonioso, as pessoas sempre vêm trabalhar com vontade. Elas têm de saber que trabalham para um bem maior.

Líder
Liderar não muda com o tamanho da empresa. O que pode mudar é a importância que se dá para as pessoas, para cada indivíduo, para cada departamento, e você tem de comunicar o tempo todo, dando clareza, dando a direção que a companhia está seguindo, dando clareza das metas. Não adianta nada você falar que está todo mundo no mesmo barco se não dá a direção que ele tem de ir. E além da direção tem de haver sincronismo entre as pessoas, as equipes. Na Axway são sete unidades de negócios que têm de trabalhar com sincronismo. A arte de liderar se aplica a qualquer empresa, não importa o porte, a natureza, se é nacional ou multinacional. Eu acredito muito em investir na formação de um líder.

O líder e a crise
Temos de continuar motivando as pessoas, tem de ter esperança, tem jeito, dá para fazer. Mas tudo isso fica muito solto se você não tiver uma segunda ação, que é a revisão da estratégia. Temos de mostrar que estamos com os produtos certos, com o preço certo, no mercado certo, no setor da economia certo, estamos montando estratégias adequadas. Mas será que não é o momento de fazer um ajuste no nosso plano estratégico para 2015, montado no final de 2014? Então, motivar, rever estratégias e, ainda, costumo dizer que tudo na vida é 90% transpiração, e 10% é inspiração, que é colocar inovação no que fazemos. Isso podemos fazer diferente. Então, também temos de trazer o componente de inovação e criatividade, desafiar. Esta crise está diferenciada, difícil, e estou aplicando essas máximas com colaboradores, parceiros e clientes.

Transpiração
Eu falei de transpiração, não? Pois é, nada de vem de graça. Você tem de se dedicar. Eu lembro que estudava à noite, trabalhava o dia inteiro, isso muita gente faz. É a fórmula que dá certo. Não é privilégio meu. Muita gente trabalha duro. O componente inovação é importante, o componente criatividade é importante, inspiração é importante, mas tem de ter o esforço. Então, é preciso perseguir novos desafios, não se dar por satisfeito, sempre estar se desafiando.

Carreira
Eu tive ótimos chefes, mas eu sabia de uma coisa, não é o meu chefe que vai ditar minha carreira. É a própria pessoa quem tem de fazer isso. Tem de perseguir a sua carreira. Eu sempre persegui promoções, não fiquei esperando alguém me guiar. Você é o dono de seu futuro, de seu destino.

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