Com a iminente implementação da reforma tributária, nos termos previstos no Projeto de Lei 2337/2021, muito se tem debatido a questão relativa à tributação dos lucros e dividendos.
Desde a promulgação e a respectiva vigência da Lei 9.429/95, os lucros e dividendos, apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, passaram a não estar sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) e tampouco integrar a base de cálculo do imposto sobre a renda do beneficiário, seja pessoa física ou jurídica.
Tal entendimento, o qual vem afastando, até o presente momento, a incidência tributária sobre os lucros e dividendos, parecia adequado na medida em que a distribuição destes só ocorre, em síntese, após a redução das despesas, chegando-se ao lucro bruto e, posteriormente, a partir do desconto dos impostos, chegando-se ao lucro líquido. Ou seja, a fração desse lucro líquido distribuída aos sócios ou acionistas corresponde aos dividendos, sobre os quais já haveria o desconto dos impostos.
Apesar disso, o artigo 3º do Projeto de Lei 2337/2021 restabelece a incidência tributária sobre os lucros e dividendos, determinando a retenção na fonte de 20% sobre o montante total dos valores a serem distribuídos, com isenção em até R$ 20 mil por mês para aqueles distribuídos por microempresas e empresas de pequeno porte, além de outras peculiaridades.
Para além da discussão acerca do cabimento dessa alteração legislativa, a nova possibilidade de tributação vem gerando uma série de incertezas aos contribuintes, como, por exemplo, a partir de quando a mudança será aplicada. Explica-se.
Considerando-se que o imposto sobre a renda não respeita o princípio da anterioridade nonagesimal, sendo eventualmente a reforma tributária aprovada em 31/12/2021 nos termos relatados, é certo que ela poderá produzir efeitos a partir do primeiro dia do exercício seguinte, isto é, 1º/1/2022. Contudo, salta aos olhos que no projeto de lei consta que já a partir dessa data os lucros ou dividendos pagos ou creditados sob qualquer forma pelas pessoas jurídicas ficariam sujeitos à incidência tributária.
Poderiam então os lucros auferidos em 2021 e distribuídos somente em 2022 ficarem sujeitos à retenção na fonte nos termos da nova lei, devendo ser apontados como renda tributável na declaração apresentada pela pessoa física à Receita Federal referente ao ano-calendário de 2022?
A resposta não é tão simples, visto que o texto legal é omisso quanto a esse ponto, hipótese esta comumente praticada pelas empresas. Assim, considerando-se tal cenário, no qual o auferimento dos lucros se daria em período pretérito à vigência da nova lei e a distribuição dos dividendos ocorreria posteriormente, isto é, em momento já abarcado por esta legislação, não haveria como se responder com precisão o questionamento acima.
Em que pese a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica — fato gerador do Imposto de Renda — venha a se concretizar na vigência da nova lei, entende-se que não seria justo “punir” os contribuintes com tal exação, na medida em que o mérito pelo auferimento do lucro líquido pela pessoa jurídica a ser fracionado e distribuído tenha sido atingido em período no qual não havia previsão para esta incidência tributária.
Portanto, antes que haja a efetiva implementação da reforma tributária, espera-se que o texto legal venha a ser ajustado, principalmente nesse ponto, a fim de evitar desnecessárias dores de cabeça aos contribuintes, bem como autuações desarrazoadas, as quais acabam por tumultuar ainda mais a tramitação dos processos em nosso país.
Inclusive, já se tem noticiado a possibilidade de o projeto sofrer novas alterações, fato este que demonstra que a reforma tributária no Brasil ainda não está sólida o suficiente para vir a se concretizar, em que pese sua implementação seja iminente.
Fonte: portalcontabilsc.com.br Por Rafael Haetinger Silber