Neste artigo você vai entender as necessidades de aprimoramento do home office para executar as atividades do dia a dia.
Dentre os desafios impostos pela pandemia da Covid-19 aos setores público e privado, destaque-se o da necessidade de adaptar e de adotar formas de trabalho que viabilizassem a manutenção de postos de trabalho e a continuidade do desenvolvimento de atividades que dependiam de atuação humana.
Uma das respostas a esta necessidade foi a adoção do regime de teletrabalho, o qual passou a ganhar maior notoriedade quando da publicação, em 2 de setembro de 1979, no jornal The Washington Post, intitulado de “Working at Home Can Save Gasoline” de autoria de Frank W. Schiff, economista chefe do Comitê para o Desenvolvimento Econômico da Conference Board.
Dentre as diversas observações relevantes para o tema e que ainda são atuais, Frank Schiff afirmou que a “nossa economia tornou-se muito menos dependente da força muscular e muito mais dependente das habilidades profissionais, técnicas e clericais” (no original, em inglês, consta “Our economy has become far less dependent on muscle power and far more dependent on professional, technical and clerical skills.”).
De fato, as habilidades profissionais e técnicas são muitíssimo mais relevantes para a empregabilidade do que foram há 20 anos. Tanto que a pandemia da Covid-19 no Brasil, propulsora da modalidade de teletrabalho, demonstrou que não apenas os ocupantes de cargos de alta gestão e profissionais de tecnologia da informação poderiam exercer suas atividades de forma eficiente (utilizar melhor os recursos disponíveis) e eficaz (alcançar os resultados esperados).
O estímulo necessário ao desempenho de atividades de forma telepresencial se iniciou, diante do regime jurídico brasileiro, pela autorização concedida pela União, conforme a Medida Provisória 927/20, quando outros setores regulados passaram a seguir a mesma estratégia, como se vê com: (i) a telemedicina (Lei nº 13.989, de 15 de abril de 2020); (ii) o teleatendimento psicológico (Resolução nº 4, de 26 de março de 2020); (iii) o teleatendimento do Poder Judiciário aos jurisdicionados (p.ex., Resolução CNJ nº 313 de 19/03/2020, Recomendação nº 08/GCGJT, de 23 de junho de 2020) etc.
Contudo, a adoção do modelo telepresencial não se demonstrou tão eficiente para todos os setores, especialmente para o da educação (ensino básico, médio, superior), pois não foram adotadas, por algumas instituições de ensino, as tecnologias necessárias para: (i) buscar o mesmo grau de atenção e imersão do aluno nos conteúdos; (ii) viabilizar adequadamente a verificação de aprendizagem de conteúdo etc. Ademais, grande parcela dos professores sequer teve treinamento adequado para utilização das ferramentas disponibilizadas. Treinamento indispensável que permitiria a estes profissionais ter informações e tempo para o desenvolvimento de habilidades suficientes para, inclusive, buscar o aperfeiçoamento e melhorias de pontos críticos desta modalidade de ensino.
Em resumo, não é suficiente a mera transmissão de imagens e voz para que se possa executar, com a mesma eficiência, qualquer atividade. Consequentemente, o desenvolvimento de atividades em teletrabalho deve ser aprimorado, experimentado e criticado para que seja possível o estabelecimento de metas e a entrega de resultados de forma, no mínimo, tão eficiente e eficaz como se o trabalho fosse presencial.
Diante deste cenário atual, cabe primordialmente ao empregador (do setor público e do privado) disponibilizar tecnologias e treinamentos para que os empregados possam aproveitar melhor estas tecnologias. Ou seja, é responsabilidade da empresa que aceita (independentemente da razão) a mudança do regime de trabalho de seu empregado, garantir a este o acesso às melhores informações, tecnologias e treinamento para a mudança da forma de execução de seu trabalho, Da mesma forma, é responsabilidade do empregado qualificar-se para ser usuário, e até desenvolvedor (quando apresenta críticas de melhoria de sistemas), das ferramentas tecnológicas de que necessita.
Sob a perspectiva jurídica, o empregador deve lidar com questões impostas pelas normas que regulam as relações do regime de teletrabalho, muito menos adaptáveis à mudança estrutural do mercado de trabalho, dispostas no art. 62, III e do art. 75-A ao art. 75-E da CLT, que basicamente tratam do seguinte:
1. Possibilidade de dispensa do controle de jornada;
2. Delimitação do que é considerado teletrabalho;
3. Necessidade de previsão contratual da modalidade;
4. Previsão contratual das responsabilidades pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito; e
5. Treinamento sobre as precauções que o empregado deva tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
Quanto à possibilidade de dispensa de controle de jornada e, com isso, ser suprimido o direito ao pagamento de horas extras, por não estar o empregador realizando o controle de jornada de seus empregados, deve-se levar em consideração que se trata de autorização legal fundamental e indispensável para a acomodação de interesses de empregados de diversas categorias. Isso porque, ao contrário da impressão de que o salário é a contraprestação apenas pelo tempo despendido pelo empregado e que o empregador teria como objetivo exigir mais horas de trabalho, o que se busca, em verdade, é que no desempenho das atividades os empregados atinjam os resultados esperados
Diante disso, há a necessidade de o próprio empregado compreender as atividades que desempenha -, os resultados esperados dentro dos prazos claramente e previamente estabelecidos) que deve alcançar, já que caberá a ele identificar a melhor forma de cumprir com o seu contrato de trabalho.
Em contrapartida, o empregado poderá: (i) despender menos tempo de locomoção diária (em São Paulo a média gasta é de 7,8 horas por semana); (ii) utilizar o tempo economizado para se aperfeiçoar acadêmica e profissionalmente; (iii) dedicar-se mais ao lazer, a esportes e à família; (iv) residir em locais com custos mais acessíveis de aluguel e IPTU, por exemplo; (v) optar por alimentação mais saudável, não necessariamente onerando o seu custo, entre outros benefícios.
Vê-se, então, que não se trata de benefício para o empregador e prejuízo para o empregado, mas de clara hipótese em que há ganhos para ambos. De um lado, garante-se melhor qualidade de vida ao empregado. Do outro, o empregador passa a poder contar com empregados conscientes de suas atribuições, obrigações e responsabilidades, dedicados a manter seus postos de trabalho não apenas pela remuneração direta e financeira, mas também pelas compensações não financeiras.
Sob outro ângulo, o empregador pode, diante de ferramentas tecnológicas disponíveis no mercado ou de ferramentas que ele mesmo pode buscar desenvolver, adotar o regime de controle de jornada. Este controle poderá se dar de forma eletrônica, cumprindo-se a Portaria nº 373 do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE (possivelmente será alterada, conforme consulta pública de portaria regulamentadora do art. 74 da CLT).
Contudo, caso o empregador não disponha de autorização em Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), tal como exigido pela Portaria nº 373 do MTE, deverá, desde que constante em acordo individual de trabalho – instrumento de prova da aquiescência prévia do empregado –, adotar sistema que: (i) viabilize a marcação do ponto de forma livre pelo empregado, inclusive de sobrejornada; (ii) vede a marcação automática do ponto; (iii) não permita a alteração ou eliminação dos dados registrados pelo empregado; (iv) sejam de fácil acesso; (v) permita a identificação de empregador e empregado; e (vi) possibilite a extração eletrônica e impressa do registro fiel das marcações realizadas pelo empregado.
Ademais, deverão ser adotadas formas de login e logoff do sistema que garantam, com maior segurança, que é o próprio funcionário quem está realizando as marcações, tais como: (i) a autenticação em dois fatores; (ii) a habilitação de dispositivo (móvel ou não) para fazer login no sistema; (iii) a utilização de certificado digital pessoal para login; (iv) obrigatoriedade de compartilhamento de georreferenciamento do dispositivo utilizado; (v) registro de mac address; (vi) registro de IP etc.
Por fim, com a única intenção de conferir maior robustez ao sistema adotado, caso necessário, o código fonte do software pode e deve ser objeto de prova, disponível para ser periciado e, com suporte em perito de confiança do juízo, ter certificadas as funcionalidades acima.
Entende-se que, diante da adoção destas medidas, fica o empregador munido de provas mais do que suficientes para afastar possíveis questionamentos de seus empregados sobre a jornada registrada, já que a realidade deve prevalecer sobre a forma (Princípio da Primazia da Realidade).
A possibilidade de controle de ponto ora retratada busca sintonia com uma das diversas iniciativas da Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzz, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, que é a do aperfeiçoamento da Justiça do Trabalho na colheita e análise de provas digitais (p. ex., registros de sistemas de dados de empresas, ferramentas de georreferenciamento e biometria) utilizadas para comprovar a realização, ou não, de horas extras pelo empregado.
Fonte: portalcontabilsc.com.br Por João Chagas de Oliveira Tourinho