A realidade é que empresas de todos os portes vêm sendo penalizadas por essas falhas. Em apenas um Estado, a Secretaria de Fazenda identificou número considerável de optantes pelo Simples Nacional, inclusive microempreendedores individuais, realizando compras em volume muito superior aos limites de receita permitidos.
Em outro, metade dos distribuidores de cerveja foi identificada realizando vendas para pessoas físicas que revenderiam o produto. Grandes corporações têm sofrido fiscalizações cada vez mais intensivas. Exemplos disto não faltam. Mesmo as participantes do grupo-piloto que acompanha o projeto com as autoridades tributárias têm enfrentado enormes dificuldades.
O fato é que vivemos em um gigantesco ‘Facebook tributário’, no qual se é obrigado a divulgar informações de compras, vendas, estoques, receitas, pagamentos e apurações tributárias. E tudo isso chega ao Fisco em milésimos de segundos, via tecnologia. Entender esta sistemática e adaptar-se a ela simplesmente passou a representar a diferença entre o sucesso e a falência empresarial.
Entretanto, tentar resolver os problemas de incoerência de dados analisando apenas os arquivos gerados não tem resolvido a questão. Ao contrário, deve-se entender a falta de integridade como sintoma e não a doença em si. Vejamos então algumas causas reais desses problemas.
A ausência de sistemas de informação que possam registrar e processar esse grande volume de dados é um dos principais fatores que levam à geração de arquivos fiscais incompletos ou incoerentes. Essa característica, típica de pequenas empresas, contrasta com outra predominante nas grandes corporações: a utilização de diversos sistemas informatizados que não se integram ou o fazem de forma precária. É que as fusões, aquisições e incorporações criam um passivo informacional de difícil e onerosa solução. Mesmo a modernização dos sistemas, bastante comum atualmente, pode criar esse quadro, dada a dificuldade, ou até mesmo impossibilidade de migração dos dados do sistema legado.
Por outro lado, estamos sujeitos à gigantesca complexidade normativa tributária, com 54 normas do gênero publicadas diariamente, 11 milhões de combinações de cálculos em impostos e 105 mil alíquotas só no Simples, além de centenas de códigos fiscais que, combinados, podem produzir milhões de variações nas obrigações acessórias.
Esse cenário caótico, para dizer o mínimo, gera problemas tanto na recepção quanto na classificação de documentos por parte de fornecedores e nas declarações produzidas com base em tais registros. Receber o mesmo produto de fornecedores distintos, com códigos, alíquotas e cálculos tributários também diferentes, é um exemplo típico dessa realidade, vivida hoje pela grande maioria das organizações.
Por fim, a pouca qualificação dos profissionais que manipulam esses dados agrava o problema. Vale ressaltar que todas as áreas das empresas têm relação direta com as informações submetidas ao Fisco relativas aos cadastros de clientes, fornecedores e produtos, estes últimos muitas vezes identificados com classificações fiscais ou mesmo unidades de medidas incorretas.
Tudo isso deixa evidente que, assim como a indústria brasileira passou por uma transformação radical na década de 1990, com a introdução de metodologias de gestão da qualidade, as empresas brasileiras agora precisam criar métodos para gerir o risco fiscal, compreendendo que a qualidade da informação neste campo depende de toda a empresa, não somente de um ou dois departamentos.
É fundamental, portanto, realizar ciclos de planejamento, execução, verificação e ajuste, mas antes de tudo, um preciso diagnóstico das vulnerabilidades que permitem, por exemplo, o recebimento de documentos errados dos fornecedores.
Mensurar os impactos financeiros potenciais e a probabilidade estatística de concretização desse risco é igualmente fundamental para priorizar e alocar os recursos necessários ao tratamento simultâneo de tantas ‘doenças’. Dependendo do resultado, podem-se utilizar estratégias distintas como aceitar, reduzir, transferir para terceiros ou mesmo eliminar totalmente o risco.
Enfim, estudar os manuais e normais das escriturações fiscais digitais é o mínimo que deve ser feito. Na prática, as empresas precisam criar modelos de gestão da informação e dos riscos fiscais. Sem isso, os custos de conformidade crescerão em níveis inaceitáveis e as autuações continuarão a se multiplicar Brasil afora, com toda a certeza.
Roberto Dias Duarte
Professor, escritor, palestrante e empresário. Realizou mais de 380 palestras, em mais de 100 cidades, nos 27 estados. Autor de 5 livros. Professor em cursos de pós-graduação e administrador de empresas com MBA pelo IBMEC.
Fonte: FISCOSOFT
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