Luft ressalta que, tomando o exemplo de uma empresa do setor de construção civil, o custo com o trabalhador pode chegar a 113,6%, englobando questões como benefícios e treinamento. “Apesar de alguns benefícios obrigatórios, como vale-transporte e alimentação, se o empregador quer dar treinamento e uniforme, isso deve ser agregado ao custo, por isso pode-se dizer que os encargos dobram em relação ao valor do salário”, afirma.
O dirigente faz uma ressalva: as empresas enquadradas no Simples Nacional têm uma vantagem em relação às obrigações trabalhistas. Para essa modalidade, dentre os encargos, apenas o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (8% do salário) é recolhido. O benefício ajuda, mas não torna o custo do trabalho exatamente baixo, já que as demais obrigações permanecem as mesmas.
A vice-presidente do CRCRS, Roberta Salvini, argumenta que esse cenário tem raízes na defasagem da legislação trabalhista, que mesmo com revisões, ainda é associada ao período de sua criação no Brasil. Para ela, uma reforma é necessária não apenas para reavaliar a questão tributária, mas porque é preciso considerar a presença da tecnologia no mercado de trabalho e a própria relação entre empregado e empregador. “Temos uma legislação que remonta à década de 1930 aplicada hoje, portanto com seus reflexos e descompassos em relação à realidade das relações de trabalho”, observa.
Roberta diz que em outros países há maior liberdade contratual entre as partes na relação de trabalho. Nesse contexto, é possível que patrões e funcionários estabeleçam se a remuneração será única ou contará com benefícios. “Isso pode ser mais interessante do que a situação que vivenciamos, com tantos direitos arraigados (numa única legislação)”, acrescenta.
Concorrência e informalidade aquecem debate sobre o peso da folha de pagamento
Se levada em conta a concorrência pela mão de obra em um cenário de baixo desemprego como o do Brasil e o esforço dos empresários em atrair os melhores talentos, a contratação pode ficar mais onerosa. “As empresas acabam competindo entre elas através dos benefícios, dos diferenciais, para conseguir o melhor colaborador”, sugere a contadora da área de recursos humanos do escritório Lauermann Schneider, Priscila Vier dos Santos. “Acredito que a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT) deveria ser revistas, ela vem de uma última revisão em 2002, já são 11 anos, e muitas coisas mudaram”, sentencia.
Mas a complexidade da legislação também pode fomentar o panorama oposto, da informalidade. O valor despendido pelo empregador com os encargos trabalhistas precisa levar em conta todas as etapas do vínculo empregatício. Admissão, treinamento e uma possível demissão. Cada fase demanda recursos que precisam ser provisionados pela empresa de antemão, fator que pode encarecer ainda mais a contratação. São questões como essa que justificam a tese de que a atual legislação não estimula a formalização do trabalho no Brasil. “No Rio Grande do Sul, temos uma segurança maior em termos do cumprimento da legislação, mas sabemos que é grande a quantidade de pessoas trabalhando em condições análogas à escravidão”, sugere a vice-presidente do CRCRS, Roberta Salvini.
Estudo aponta que empresas podem gastar até três vezes mais do que o salário
Pesquisadores do Centro de Microeconomia Aplicada da Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), desenvolveram um estudo que concluiu que o custo de um trabalhador ao empregador pode superar em 2,83 vezes (ou 183%) o valor do salário assinado em carteira. O montante é alto, mas guarda algumas peculiaridades. Esse valor se aplica a um vínculo empregatício de 12 meses, podendo cair para 2,55% (155%) quando o tempo de contratação alcança cinco anos. Os pesquisadores contaram com dados de duas empresas têxteis para elaborar os resultados.
O levantamento, divulgado no ano passado, não se restringiu a calcular apenas o peso dos encargos. Os pesquisadores identificaram que, em geral, muitos fatores que encarecem a contratação, e por vezes beneficiam o trabalhador, vinham sendo ignorados no debate. O custo estimado pelos pesquisadores também englobou obrigações acessórias, benefícios negociados e até mesmo o custo da burocracia e da gestão do trabalho. “O nosso entendimento é que há muitos itens que normalmente as empresas entendem como encargos e não são puramente encargos”, afirma o economista Eduardo Zylberstajn, um dos autores da pesquisa.
Além do custo de benefícios obrigatórios como o 13º salário ou Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), o estudo leva em conta diversos benefícios que não estão previstos na legislação, mas que podem ser pagos em função de acordos ou convenções coletivas, a exemplo de treinamento, cesta básica e auxílio-creche, entre outros.
Também influencia na fórmula a maneira com que o trabalhador vê os benefícios que recebe. Se o colaborador tem consciência de que há mais benefícios agregados aos seus vencimentos, ele acaba custando menos à empresa. Conforme o relatório final da pesquisa, que definiu valores máximos e mínimos para cada componente do trabalho, foi estimado que a legislação trabalhista tem um peso entre 17% e 48% do custo total do trabalhador. Ou seja, um contrato de trabalho que custe R$ 2.067,00 para a empresa é valorizado em R$ 1.158,00 pelo empregado no caso mais extremo, o que implica em uma diferença de R$ 909,00. Nesse sentido, o custo da legislação trabalhista implica um aumento de 79% na remuneração total do trabalhador. No caso mais conservador, um trabalhador que custa os mesmos R$ 2.067,00 por mês para o empregador percebe um valor de R$ 1.713,00 no contrato de trabalho. Nesse caso, o custo da legislação trabalhista seria R$ 354,00, ou 21% da remuneração percebida pelo empregado e 17% do custo total para o empregador.
Desoneração não é suficiente
As recentes desonerações na folha de pagamento promovidas pelo governo federal, que em tese deveriam amenizar o cenário, ainda são contestadas. Serão 22 segmentos de varejo incluídos na medida, que substitui os 20% de alíquota do INSS pelo recolhimento de 1% a 2% do faturamento das companhias. A vice-presidente do CRCRS, Roberta Salvini, afirma que essa dinâmica apenas muda o custo de lugar. “Essa ação não gera uma redução tributária significativa, pois deixou de tributar folha para tributar faturamento. Em mais de 90% dos casos, o custo tributário, na ponta do lápis, aumentou”, calcula a contadora.
O contador Celso Luft completa que, no caso da atual desoneração da folha, o fato de não ser facultativa pode tornar ainda mais onerante o conjunto de encargos. “Quem investiu em tecnologia, por exemplo, e teve uma redução no quadro de funcionários, acabou sendo penalizado por essa legislação”, diz. Isso porque com um volume menor de colaboradores, os recursos referentes à folha de pagamento já estariam reduzidos, fazendo com que o percentual sobre faturamento seja maior do que o próprio custo dos salários e seus encargos.
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