Sistema tributário no Brasil é altamente complexo e precisa de mudança completa

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“Enquanto o Brasil está preocupado com questões internas sobre ICMS e PIS/Cofins, as guerras fiscais globais fora do Brasil estão apenas começando. O Brasil precisa perguntar se tem a vontade de estabelecer e promover regimes fiscais efetivamente favoráveis aos investidores nacionais e estrangeiros, não incentivos fiscais especializados para regiões e indústrias especializadas”.
A opinião é do advogado americano Richard Winston, do Winston Legal Group. O advogado defende uma mudança completa no sistema tributário brasileiro por ser “altamente complexo” com regimes e incentivos especiais, isenções, suspensões, deduções de deduções, impostos sobre impostos.
Winston lembrou que a reforma tributária dos EUA foi possível devido à cultura colaborativa entre o governo e a indústria. Segundo ele, muitos funcionários do governo americano têm experiência em empresas privadas e afirma que o sistema tributário do Brasil não será capaz de absorver grandes alterações legislativas se não puder fornecer uma base estável para interpretar e implementar as alterações.
Além disso, Winston diz que o Brasil precisa se perguntar como tornar as suas empresas mais competitivas numa base global, enquanto a guerra fiscal global se aquece. “O resto do mundo está se movendo com ou sem o Brasil como um grande concorrente global. O país pode pular no trem, ou ver como o trem se afasta”.
“O Brasil entende muito bem a mensagem da competição global quando se trata de futebol, e também entende o que acontece se ele se deixa ficar muito confortável pensando que é grande, simplesmente porque era grande no passado. Presidente Trump foi eleito porque o americano médio parou de sentir que os EUA eram um lugar competitivo no mundo”, ressaltou o advogado em entrevista ao JOTA.
Winston é especializado em direito tributário e estrutura transações que envolvem a América Latina e a Europa.
Leia a entrevista
JOTA – A reforma norte-americana pode impactar a reforma brasileira?
Richard Winston – A reforma tributária dos EUA sucedeu porque o Presidente Trump foi eleito com base numa mensagem “nacionalista” para melhorar a competitividade global do país. O Presidente Trump não gastou muito tempo trabalhando nos detalhes da reforma tributária, mas ele apoiou os princípios. Muitos membros do Congresso têm disposição para suportar grandes ataques pessoais a nível local e na mídia para garantir que os EUA, como um todo, permaneça competitivo em uma base global.
Ninguém quis falar publicamente sobre como o imposto de renda de 21% visava manter os EUA competitivo, à luz da tendência Europeia para reduzir as taxas de imposto. Por outro lado, o Presidente Trump estava constantemente falando em termos simples sobre a necessidade do país para manter os empregos nos Estados Unidos e incentivar as maiores empresas americanas para repatriar o seu dinheiro “offshore.”
Enquanto o Brasil está preocupado com questões “internas” sobre ICMS e PIS/Cofins, as guerras fiscais globais de renda fora do Brasil estão apenas começando. O Brasil precisa perguntar se tem a vontade de estabelecer e promover regimes fiscais efetivamente favoráveis aos investidores nacionais e estrangeiros, não incentivos fiscais especializados para regiões e indústrias especializadas.
O Brasil também precisa mudar o seu método de administração tributária. A reforma tributária dos EUA foi possível devido à cultura colaborativa entre o governo e a indústria. Muitos dos funcionários mais talentosos do governo americano, em todos os ramos dos três poderes, têm experiência substancial em empresas privadas. Um sistema não será capaz de absorver grandes alterações legislativas se não puder fornecer uma base estável para interpretar e implementar as alterações.
JOTA – Quais são as principais diferenças e semelhanças entre a reforma tributária americana e a brasileira?
Richard Winston – Os Estados Unidos decidiram abordar a reforma tributária antes de abordar cortes de gastos e estabelecer princípios competitivos para o futuro. Agora que a reforma tributária está concluída, os Estados Unidos começarão a tratar de cortes de gastos.
O Brasil parece estar olhando para cortes de gastos primeiro. Os cortes em programas sociais e pensões podem ser importantes para uma economia local, mas tais cortes não farão o Brasil mais competitivo em relação a outros países.
A reforma tributária brasileira parece estar focada em setores específicos, por exemplo óleo e gás, e grupos específicos que têm poder em Brasília para buscar tais reformas.
De um modo geral, a reforma tributária dos EUA não foca em indústrias ou regiões específicas. A ideia da reforma tributária dos americanos foi olhar para o futuro e os desafios que os EUA enfrentavam com sua alta taxa de imposto corporativo e um sistema de imposto internacional velho.
JOTA – O Brasil deve ser espelhar em algum ponto da reforma americana?
Richard Winston – O sistema tributário dos Estados Unidos começa de um ponto muito diferente do sistema tributário brasileiro. O imposto de renda dos Estados Unidos muitas vezes parece complexo, mas os americanos têm mais do que 100 anos de precedentes judiciais que permitem que a maioria das empresas e seus assessores reivindiquem posições consistentes, sem medo do ataque do governo. Não foi muito difícil para o Congresso dos Estados Unidos modificar as provisões do código tributário existente sem criar um trauma em todo o sistema. Haverá alguns erros, e vamos ver um projeto de correção técnica introduzidos neste ano ou no próximo ano para corrigir os erros.
Os indivíduos sempre tiveram papeis tímidos nas discussões de reformas tributárias. A grande luta nos Estados Unidos, enquanto política fiscal, é a de usar as regras tributárias como forma de estimular a economia.
JOTA – O que é necessário para que a reforma tributária brasileira tenha sucesso?
Richard Winston – O sistema tributário brasileiro é altamente complexo com regimes especiais, incentivos especiais, isenções, suspensões, deduções de deduções, impostos sobre impostos. A reforma tributária brasileira exigiria uma revisão completa do sistema, e não é claro se alguém aceitaria tais mudanças sem o mesmo tipo de mensagem “nacionalista”, por exemplo, o Brasil contra o mundo, que o Presidente Trump foi capaz de usar junto aos americanos.
O Brasil precisa perguntar a si como tornar as suas empresas mais competitivas numa base global enquanto a guerra fiscal global se aquece. O resto do mundo está se movendo com ou sem o Brasil como um grande concorrente global. O Brasil pode pular no trem, ou ver como o trem se afasta. O Brasil tem descoberto a partir de decisões da WTO [World Trade Organization] que a concessão de subsídios fiscais para as suas indústrias favoritas, enquanto ataca os mesmos subsídios oferecidos por outros países, não é provavelmente a melhor maneira de se manter competitivo.
JOTA – O Brasil deve estar preocupado com a competição global?
Richard Winston – O Brasil entende muito bem a mensagem da competição global quando se trata de futebol, e também entende o que acontece se ele se deixa ficar muito confortável pensando que é grande, simplesmente porque era grande no passado. Presidente Trump foi eleito porque o americano médio parou de sentir que os EUA eram um lugar competitivo no mundo.
Da mesma forma, no futebol, os americanos são um pouco como o sistema tributário brasileiro (em todo o lugar). Os americanos não acreditam que eles vão jogar melhor futebol simplesmente copiando as equipes e os estilos brasileiros de jogo. Os americanos sabem que não começam do mesmo lugar que os brasileiros. Quaisquer alterações à cultura do Futebol junto aos americanos precisa aparecer como um renovação completa do sistema, junto com muitas novas ideias, alimentadas por peritos com experiência global.
Quando você está tentando competir em uma plataforma internacional, você deve ser crítico consigo mesmo. Os americanos se viram perdidos em questões fiscais em todo o mundo (especialmente após o início do projeto BEPS) e a nova reforma tributária é uma grande conquista para a economia americana.
JOTA – Os principais pontos do debate sobre a reforma norte-americana sempre foram criar um sistema tributário mais simples e aumentar a competitividade das empresas norte-americanas por meio da redução da carga tributária?
Richard Winston – Sim. O primeiro objetivo da “simplicidade” para a reforma tributária falhou. No final, outro conjunto de regras complexas modificou e substituiu as regras fiscais anteriores.
O segundo objetivo de aumentar a competitividade corporativa em bases internacionais foi muito bem-sucedido através da redução das alíquotas de imposto de renda corporativas de 35% para 21%. A expectativa era que após a eleição do presidente Donald Trump as taxas de imposto de renda corporativas iriam cair, mas não para tão baixo quanto 21%. Esta nova taxa de imposto dá às empresas americanas uma vantagem competitiva relevante sobre os seus adversários internacionais (por exemplo, Boeing versus Embraer).
Os EUA, diferentemente do Brasil, permitem a tributação sobre a renda (imposto de renda) pelos Estados e pelo Governo Federal. Por razões óbvias, a reforma tributária do Presidente Trump trata do imposto de renda federal, seja sobre os lucros das empresas, seja sobre os rendimentos dos indivíduos.
JOTA – É correto chamar a reforma tributária dos EUA de a reforma tributária de Donald Trump?
Richard Winston – Isso um equívoco. A maioria das ideias que constam do pacote final de reformas se originaram em um congresso Republicano em 2014. As ideias incluíam um grande corte de impostos para indivíduos e corporações, regras de repatriação obrigatória para todos os lucros mantidos por subsidiárias no exterior e a uma mudança do sistema americano de um “sistema fiscal mundial” para um “sistema tributário territorial modificado”, ou seja, tributação apenas sobre os lucros domésticos.
A proposta original de 2014 foi considerada radical à época. Com o Presidente Obama, um democrático, na Casa Branca, ninguém considerou que a proposta teria chance de se tornar lei. Quando o Presidente Trump tornou-se presidente baseando sua campanha numa reforma tributária, tudo mudou.
A proposta não andou durante o ano de 2017 porque o Congresso concentrou a sua atenção inicial na revogação do Obamacare [sistema de cuidados de saúde obrigatório]. Obamacare foi criado com um adicional de imposto de 3,8% sobre vários tipos de renda de investimento. O objetivo do Congresso, portanto, foi primeiro eliminar esta sobretaxa antes de se concentrar no pacote maior de reforma tributária.
As tentativas de revogar o Imposto Obamacare dentro do Congresso falharam. O adicional de 3,8% continua em vigor hoje. Ultrapassada a questão do Obamacare, o maior obstáculo para a reforma tributária se deu dentro do Partido Republicano, já que referido partido controlava as duas casas do Congresso – Senado e Câmara.
JOTA – Quais foram as principais divergências dentro do partido Republicano?
Richard Winston – As divergências se deram em razão de discussões acerca da necessidade de se realizar cortes de custos na mesma proporção dos cortes de receita. O argumento político feito por muitos republicanos é que os cortes de gastos não seriam necessários, pois as reduções de impostos estimulariam o crescimento econômico e, assim, a arrecadação tributária final. Muitos republicanos, no entanto, são céticos acerca desse argumento.
JOTA – Como foi a votação do projeto no Congresso?
Richard Winston – Uma das maiores realizações do Congresso, que passou despercebida, foi para passar um orçamento com teto fixo global de déficit, em vez de resoluções tratando de limites de gastos separados. Essa medida permitiu, pela primeira vez em seis anos, que o Congresso aprovasse a proposta de reforma tributária com apenas um voto majoritário, em votação simples, de ambas as casas, com a assinatura do Presidente. Se o Congresso não tivesse passado um orçamento unificado, o Senado poderia ter derrotado o projeto de lei com o voto de apenas 41 dos 100 membros. Ao mesmo tempo, aprovando um orçamento unificado, a maioria dos políticos sabia que a possibilidade de negociação de resoluções individuais seria limitada. Ao final, a unificação orçamentária teve por resultado unificar os republicanos no Congresso para atuar como um grupo coerente.
Vale notar que o Presidente Trump não gastou oficialmente muito tempo trabalhando a aprovação da proposta no Congresso. Na verdade, o Presidente Trump publicou apenas um documento de uma página para esboçar as mudanças propostas. Por outro lado, há rumores de que o Presidente Trump foi muito ativo ao telefonar para os republicanos no Congresso para pressionar a passagem de vários de seus itens favoritos.
JOTA – Qual foi a regra mais controversa no pacote da reforma tributária?
Richard Winston – Uma regra que proibia aos particulares a dedução de seus impostos estaduais contra seus impostos federais, acima de US$ 10 mil. A dedução era ilimitada no passado, e os estados com alta carga tributária, como Nova Iorque e Califórnia, possuem população majoritária democrata. Um advogado americano médio ou investidor que trabalha em Nova Iorque provavelmente terá um aumento de imposto em razão da reforma tributária. A maioria dos cidadãos, em especial aqueles que vivem nos estados com baixa carga tributária, deverão ter reduções de imposto de renda.
JOTA – A reforma prevê um sistema tributário territorial, isentando a maioria dos lucros obtidos no exterior dos impostos dos EUA. Como essa alteração funciona na prática?
Richard Winston – A partir da reforma as empresas americanas não irão pagar impostos sobre os dividendos recebidos nos EUA que receberem de subsidiárias estrangeiras. No entanto, as novas regras mantiveram um recurso anti-evasão para impedir que as empresas evitem o imposto de renda sobre rendimentos não operacionais que é auferido fora do país.
No passado, as empresas pagavam o imposto de renda federal a uma taxa de 35% quando recebiam dividendos nos EUA, embora pudessem reivindicar créditos fiscais estrangeiros contra o imposto de renda a ser pago localmente. As empresas americanas também podiam diferir indefinidamente a tributação dos lucros operacionais mantidos no exterior. Assim, a maioria das empresas americanas estruturou suas atividades estrangeiras para minimizar os impostos estrangeiros, porque elas não pretendiam repatriar o dinheiro para os EUA e pagar 35% de imposto. Sob as novas regras fiscais, os ganhos auferidos no exterior podem ser repatriados para os EUA sem qualquer outra tributação.
Para causar uma transição das regras antigas para as novas regras, as empresas americanas devem agora pagar um imposto sobre os lucros acumulados e ainda não repatriados, mantidos no exterior – 15,5% para dinheiro mantido no exterior e 8% para ativo não líquidos.
As empresas americanas são elegíveis para reivindicar créditos fiscais estrangeiros contra este imposto, com base na taxa antigo de imposto de 35%. O novo regime fiscal irá incentivar muitos empresas americanas para livremente mover dinheiro para os Estados Unidos, embora as regras não determine que as empresas façam efetivas remessas de recursos para os EUA.
JOTA – As técnicas de planejamento tributário para reduzir a tributação mundial permanecem válidas?
Richard Winston – Sim. Por exemplo, se uma empresa multinacional dos EUA está investindo no Brasil, a empresa dos EUA ainda vai querer capitalizar a subsidiária brasileira com certos níveis de dívida de forma que a empresa brasileira possa reivindicar uma dedução de juros contra os 34% de imposto de renda corporativo brasileiro, ainda que o pagamento de rendimentos do Brasil para os EUA estejam sujeitos à alíquota de 15%.
Assim como antes, a empresa americana também vai querer que o pagamento de juros seja efetuado para um país com baixa carga tributária,desde que não seja considerado um país classificado como paraíso fiscal pelas regras brasileiras. Isso a fim de evitar o pagamento do imposto de renda de 21% sobre o recebimento do pagamento de juros. Se o pagamento de juros pode ser transferido para um país que cobra taxas de imposto mais baixas, os fundos restantes podem ser remetidos para os EUA como dividendos sem quaisquer impostos adicionais.
Fonte: Fenacon

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